sexta-feira, 3 de setembro de 2010

"Nem homem, nem mulher. Gente"

Para alguns, os anos 60/70 foram os mais prósperos da nossa cultura. Há quem discorde e diga que atualmente se produz em maior quantidade, intensidade e com tanta qualidade quanto naqueles tempos. Mas não há como negar uma coisa: a vontade de revolucionar a cultura, quebrar padrões vigentes e lutar contra preconceitos estéticos, culturais, raciais e de gênero eram características muito mais fortes naqueles tempos em que a ditadura militar assombrava e ao mesmo tempo estimulava a produção cultural nas diversas áreas.

Em meio a tanta pressão dos militares, surgiram durante a ditadura alguns grupos, artistas e movimentos que marcaram a história da cultura brasileira. Chico Buarque, Caetano, Gil, o Tropicalismo, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, a Jovem Guarda... todos eles foram bastante estudados e tiveram seus lugares ao sol devidamente reservados. Mas uma parte dessa efervescência cultural começa a ser esquecida pelos que viveram a época e sequer são conhecidas pelos jovens de hoje. E foi para lutar contra esse esquecimento que os diretores Raphael Alvarez e Tatiana Issa resolveram encarar a produção do documentário Dzi Croquettes.

Utilizando-se de depoimentos marcantes, imagens de arquivo e uma boa dose de humor, o documentário apresenta o percurso trilhado pelo grupo Dzi Croquetes que, ainda na década de setenta, escandalizava as platéias brasileiras ao lutar contra a ditadura, a censura e os preconceitos de gênero de uma maneira bem humorada e pra lá de inusitada. A autodefinição já acusa o tom da proposta. "Nem homens, nem mulheres. Gente". Era um grupo de Gente, com todas as suas formas e pelos característicos do sexo masculino, vestidos e pintados como mulheres, num espetáculo que misturava teatro, música, dança e tudo o mais que pudesse chocar o público e quebrar algumas regras. Era a sexualidade posta em xeque de uma maneira clara, criativa e incisiva.

Premiado em diversos festivais pelo país, o documentário Dzi Croquetes chega para salvar do esquecimento um dos grupos de vanguarda com maior êxito do período militar. Sucesso de crítica e público num Brasil que parecia não oferecer condições para tais manifestações, o grupo chegou a fazer longas turnês pela Europa (específicamente na França, onde também conseguiu conquistar rapidamente o público).

Dzi Croquetes é o delicioso retrato de um grupo que pensava e agia de uma maneira muito a frente do seu tempo. Sem preconceitos, sem pudor, sem censura. O documentário será apresentado hoje, às 20hr, no Mercado da Ribeira/Olinda.

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